quinta-feira, abril 25, 2013

O ciclo de quimioterapia que começou bem e acabou muito mal...

O segundo ciclo de quimioterapia correu bastante bem, tendo em conta o que ela tinha passado no primeiro. Conseguiu comer sempre, comia pouco mas comia, e nem sequer vomitava (ou acontecia poucas vezes). Eu, do outro lado do hemisfério, tinha todos os dias o coração nas mãos. Liguei-lhe no dia da mãe, já eu estava a deitar-me e ainda estava apenas a começar a visita dela nesse dia. Doeu muito não estar com ela mas, pelo menos, ela parecia bem. Liguei-lhe a caminho de empresas, depois de palestras em universidades e até no barco a caminho de Macau. Nunca me custou tanto estar tão longe...

Chegada a Portugal, fui visitar a minha mãe. Ela estava abatida mas sentia-se um pouco melhor do que da primeira vez. Tinha febre algumas vezes, vomitava esporadicamente mas até conseguia comer qualquer coisa e parecia bem melhor do que no primeiro ciclo. Transmitimos-lhe força e dissemos-lhe que provavelmente era o organismo que estava a responder melhor ao tratamento, o que era verdade mas nunca se sabe como vai ser a seguir. 

Uns dias depois ela teve um pico elevadíssimo de febre e uma quebra de tensão extrema e desmaiou: foi um choque séptico mas os médicos conseguiram reagir a tempo e ela sobreviveu. Mas esse dia marcou um ponto de viragem, ela não tinha forças para nada, não conseguia comer, estava sempre a vomitar e o corpo não reagia como ela queria.

Durante dias, talvez semanas, diariamente fomos ter com ela só para estar junto da cama dela, para ela saber que estávamos lá para ela. Durante dias, talvez semanas, diariamente ela nos recebia de olhos fechados e sem dizer uma palavra. Ocasionalmente abria os olhos para voltar logo depois a fechá-los. Lentamente, muito lentamente, mas um bocadinho mais a cada dia, fomos percebendo que ela se afastava de nós, que ela estava a desistir. E nós, ao lado dela, sentíamo-nos impotentes, não podíamos fazer nada, nem sequer os médicos podiam fazer.

Nessa altura, deixámos de autorizar visitas pois as pessoas quando lá iam, ao tentar falar com ela, só a deixavam mais em baixo. Ela não tinha forças para nada, estava a desaparecer à nossa frente...

Um dia uma prima nossa que viveu connosco veio a Lisboa e pediu-nos para a visitar com o marido. Deixá-mo-los ir. Quando ela me perguntou, antes de entrar, como ela estava, só pude dizer: mal, ela está a desistir, eu não sei mais o que fazer. Quando ela saiu de lá ficou com a mesma ideia.

Um dia, ela abriu os olhos apenas para me dizer "adeus, eu levo-te a ti a à tua irmã no coração e não se esqueçam da avó (a mãe dela). Vão vê-la e buscá-la sempre que puderem". Saí de lá lavada em lágrimas mas disse-lhe que não, que ela não se ia embora, ainda tinha que acompanhar as filhas durante muitos anos, por isso não podia ir a lado nenhum. Ao sair daquele quarto, no entanto, eu sabia que ela estava no limite, já tinha desistido, e que o mais provável era que aquele adeus fosse uma verdadeira despedida.