segunda-feira, novembro 27, 2006

"Para onde caminha o guionismo em Portugal?" - continuação

Dia 24 de Outubro discutiu-se o guionismo em Portugal. As suas tendências e projectos de futuro foram tema de debate na Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa.

Original vs Adaptação

João Nunes, das Produções Fictícias, referiu que, "num mundo ideal, todos preferiamos trabalhar com formatos originais". Salientou ainda que não vivemos num mundo ideal mas sim num mundo de negócio, "um negócio que tem de ser rentabilizado e quem tem dinheiro tem medo de arriscar num guião que não conhece". Este autor lembrou ainda que nem sempre as adaptaçõs garantem sucesso.
"Acho que teríamos mais a ganhar com originais. Espero que se encontre um equilibrio e que os programadores tenham mais em conta as identidades próprias e que venham a apostar mais em originais" - é a esperança deste guionista das Produções Ficticias.

Manuel Arouca lembrou que o único grande sucesso adaptado foi "Anjo Selvagem". Referiu que "Floribela" não atinge todas as faixas etárias e está em declinio. "É um grande fenómeno de merchandising e não de audiências" - referiu este autor. "Às vezes custa-me a acreditar porque se fazem adaptações..." - confidenciou Manuel Arouca.

Rui Vilhena, da Scriptmakers, mostrou-se "completamente contra as adaptações mas percebo que as pessoas que tomam decisões não queiram correr riscos".

João Matos, da DotSpirit, relembrou que uma adaptação não é só trazer de fora e que também se fazem adaptações de livros, de peças de teatro, etc. Para este autor "adaptação é quando se pega em algo já existente e se torna o texto um bocadinho seu". Este guionista da DotSpirit afirmou ainda que o grau de dificuldade de uma adaptação é bastante maior, "há uma grande responsabilidade em relação ao autor principal" - disse.
Este autor referiu ainda que numa adaptação se trabalha sobre a obra final (já corrigida) e "aprende-se muito". No entanto, não nega que uma obra original dá muito mais prazer.
João Matos referiu que numa adaptação é muito interessante como se podem fazer as pontes culturais. Porque há que adaptar o objecto à cultura em que se vai inseri-lo. "Não há uma única adaptação nem uma só forma de adaptação, há um trabalho sobre a obra de outro autor. Implica responsabilidades, implica dores de cabeça mas uma obra orginal também" - resumiu.
Este guionista da DotSpirit considera que adaptação e original existem lado a lado. "Porque é que há-de ser mais erudito adaptar "O Crime do Padre Amaro" do que a "Floribela"? É diferente mas não tem que ser medido qualitativamente" - defendeu este autor.

Paulo Filipe Monteiro, recordou o potencial perigo da televisão ao ter poucos espaços para experimentar.

Pedro Lopes, da Casa da Criação, defendeu que as adaptações são uma boa escola. "Às vezes confundem-se as adaptações com as traduções e as adaptações NÃO são traduções" - realçou este autor.
"As adaptações não são melhores nem piores, são um desafio, tal como o é um original" - sintetizou.

Os limites do guionismo/ da televisão em relação ao sexo

João Matos considera que o limite "é a lei".

Paulo Filipe Monteiro foi parco em palavras e deixou o seu ponto de vista em forma de gracejo. "É como na vida: sempre que valer muito a pena... e nem sempre tem de estar gente a assistir..."

Rui Vilhena observou que a tendência do mercado da vida sexual está a tomar o protagonismo. "Vejo muito isso nas coisas que vêm de fora" - disse. No entanto, é importante lembra que a maior parte dos formatos com maior teor sexual vêm do cabo e é dificil quando se passa para uma TV generalista. "Ainda é um terreno pantanoso e perigoso" - conclui Vilhena. "Admiro a SIC por ter corrido esse risco e acho que é uma tendência à qual vai ser dificil fugir" - realçou este autor.

Manuel Arouca referiu que "o sexo em televisão é um pau de dois bicos" - pode chamar ou pode afastar. "O mito do sexo é o bom gosto, é a oportunidade" - resumiu este autor.

João Nunes lembrou que se fala de um factor novidade que não é assim tão novo. Já a novela "Gabriela" tinha". "O que é preocupante é quando o sexo deixa de ser o picante adicionado á história e passa a ser a história" - lembrou o autor. Nesses casos as pessoas fogem. Sabendo que o teor desta discussão tinha como base estrutural a novela "Jura", João Nunes fez questão de frisar que não sabia se era este o caso desta novela pois nunca a tinha visto.

Eu concordo com João Nunes pois acho que o sexo já deixou de chocar. É algo já muito perto do considerado normal. Se as pessoas perceberam porque estão a ver aquela cena e se acharem que tem sentido dentro da estória, não a vão rejeitar.

Quanto à novela "Jura" acho que tem um grande potencial pelos temas que aborda mas falhou na aposta que fez em sexo/ nudez. Muitas vezes as cenas de sexo não acrescentam nada à estória, estão ali para chamar a atenção do espectador e depois os temas que mereciam ter maior destaque acabam por não o ter. E nessa altura, as pessoas pegam no comando e mudam para a TVI. Para verem mais do mesmo, ao menos vêem uma novela que tenha algum sumo e de um tipo ao qual já estão habituados. Eu acho que a "Jura" pode vir a ser boa, não sei é se vai conseguir convencer os espectadores que já mudaram de canal.
Aliás, para mim essa novela tem outro ponto que afasta as pessoas, é completamente irreal que, num grupo de grandes amigos, toda a gente vá para a cama com toda a gente. Um ou outro até se admitia que acontecesse na realidade agora.......todos, acho dificil de acreditar.

Durante o tempo aberto ao debate e às perguntas do público ainda se falou na vaga de novas séries americanas que têm chegado a Portugal. Falou-se de que elas têm lugar porque as televisões por lá apostam em coisas novas...e comparou-se isso ao fechamento das nossas estações.

Eu acho que nunca se pode comparar os EUA e Portugal relativamente a isso. Quanto canais têm os EUA? E Portugal? É claro que, se os EUA são, incomparavelmente, maiores e têm muito mais canais de televisão, conseguem estar abertos a mais coisas. Aliás, nos EUA os canais regionais têm bastante sucesso e precisam de novas ideias para completarem as suas grelhas. Se olharmos para o panorama audiovisual português, vemos que por cá o cenário é bem diferente...

Acho que não podemos comparar alhos com bugalhos...mas isso não nos impede de olhar para o que de bom se faz e tentar lá chegar!

terça-feira, novembro 14, 2006

"Para onde caminha o guionismo em Portugal?"

Dia 24 de Outubro discutiu-se o guionismo em Portugal. As suas tendências e projectos de futuro foram tema de debate na Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa.

Falou-se bastante da telenovela pois é o formato com maior dimensão e visibilidade em Portugal. Mas guionismo em terras lusas não se limita a telenovelas e houve ainda lugar a 'uma perninha' sobre outros formatos.

Guionistas presentes:
- Pedro Lopes, da Casa da Criação;
- João Matos, da DotSpirit;
- João Nunes, das Produções Fictícias;
- Manuel Arouca;
- Paulo Filipe Monteiro, também professor de guionismo na Universidade Nova;
- Rui Vilhena, da Scriptmakers.

Pedro Lopes começou por distinguir a novela como "formato da palavra." Salientou ainda a chegada ao audiovisual e à telenovela de "toda uma linguagem de videoclip e de jogos".

Está-se, visivelmente, numa altura de mudança. A telenovela está diferente, no seu ritmo, na sua linguagem, nos seus personagens. Também a sociedade está em mutação. A telenovela hoje é diferente da telenovela de ontem e será também diferente da telenovela de amanhã. No entanto, a essência mantêm-se e o formato está longe de estar esgotado.

Paulo Filipe Monteiro observou que "as personagens são a chave de um bom guião" e relembrou a necessidade de "captar o dia-a-dia para fazer bons personagens".

A novela pode ensinar e pode pôr as pessoas a pensar. Faz pensar menos do que outros formatos, sem dúvida, mas ainda assim faz pensar. E faz pensar pessoas que, muitas vezes, não consomem outro tipo de formatos. Porque não passar-lhes alguma informação ainda que num formato algo soft?
A verdade é que as pessoas seguem as vidas retratadas nas telenovelas durante vários meses e sabem os nomes dos personagens. Se houver uma personalidade histórica na telenovela, ainda que diferente do que foi a pessoa, se calhar quem consome este formato passa a saber, pelo menos, o seu nome, que ela existe e que teve alguma importância.

João Matos lembrou que até há bem pouco tempo certas palavras eram proibidas: "em 2001, a palavra homossexual era dificil de entrar num guião". João relembrou que um guionista não pode esquecer-se que está a trabalhar para uma indústria que tem as suas regras. No entanto, "é sempre possível fazer alguma coisa". Este argumentista da DotSpirit reforçou a ideia da existência de uma nova linguagem. Escrever um guião é "fazer todos os dias algo diferente. É uma dança entre quem vê e quem escreve" - resume.

Rui Vilhena alertou para a importância de "consumir tudo, principalmente o que se faz lá fora porque, se isso funcionar, vai ser importado". Este guionista da ScriptMakers considera que o que faz um guionista é 50% de técnica e 50% de 'feeling'. "Um guionista tem de preocupar-se com a técnica e acompanhar as tendências; acompanhar a mutação e ter atenção ao ritmo".

Manuel Arouca relembrou o sucesso de "Jardins Proibidos" a série que impulsionou uma maior produção nacional. "Foi talvez uma novela de emoções e por isso teve tanto sucesso. Foi algo que a Globo sempre fez". No entanto, este autor considera que este tipo de novela acaba por saturar e nasce uma necessidade de novelas de autor. " 'Ninguém como Tu' veio quebrar o que era preciso" - realçou. Foi, talvez, a 'lufada de ar fresco' de que já se precisava. Manuel Arouca considera que "a novela vai funcionar sempre ainda que esteja sempre a mudar. Sempre o mesmo cansa".

João Nunes salientou uma nova tendência que passa por criar coisas que possam funcionar em suportes diferentes. "A linguagem tem estado sempre condicionada por motivos técnicos". No entanto, este argumentista das Produções Ficticias constactou que ninguém sabe como se vai escrever para os novos meios. "Ainda está por descobrir a linguagem própria dos novos meios" - sintetizou.

Também a telenovela nasceu na rádio e foi mais tarde transposta para a televisão. Houve necessidade de uma grande aprendizagem e uma consciencialização acerca das diferenças dos suportes e das especificidades de cada medium.

Falou-se ainda de originais versus adaptações e dos limites de certos temas - mas isso fica para uma próxima postagem...

terça-feira, novembro 07, 2006

"Cada ser humano, mesmo que sujeito a terríveis condições, é minimamente capaz de distinguir o bem do mal. Tem liberdade de opção, mesmo que limitada - ou seja, é responsável pelos seus actos e como tal tem de responder por eles. É essa liberdade que faz a nossa humanidade."

Esther Mucznik , Público de 3 de Março de 2006